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Ioga e sua Contribuição para a Saúde

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Marcos Rojo Rodrigues

Professor de Educação Física pela Universidade de São Paulo

Especialista em Ioga pela Escola de Kaivalyadhama (Índia)

Todo trabalho do corpo humano feito no sentido preventivo ou terapêutico, deve considerar os diferentes fatores que influenciam a saúde. Segundo a ioga, os aspectos físico, mental e social deverão ser tratados conjuntamente para que este trabalho fique completo.

Há muita confusão em conceitual ioga. Para alguns ela é uma espécie de religião, para outros é ‘faquirismo’ e há ainda aqueles que imaginam como uma espécie de ginástica lenta. Quando se fala em praticar ioga, sempre vem à mente a execução de posições estranhas e em geral com aparência desconfortável. Não sendo entendidas e relacionadas como exercícios psicofísicos, fica difícil perceber a abrangência de seus efeitos e sua relação conjunta.

Ioga é uma disciplina antiga, de data desconhecida. Textos épicos indianos já faziam referência a ela, mas é por volta do ano 500 a.C. que surgiu o primeiro texto exclusivo sobre o assunto, escrito por Patanjali e que a colocou como um dos sistemas de filosofia da Índia. Com o tempo foram aparecendo várias linhas e escola de ioga, mas todas com a mesma finalidade.

Ioga é por definição um estado da mente, de controle e equilíbrio que, no seu grau mais avançado, tem o nome de Samadhi, ou seja, saúde perfeita. Para atingir-se o calmo ou meditativo, pressupõe-se saúde perfeita, de onde vem a idéia de sistema complexo para chegar a tal estado.

O sistema de ioga apresentado por Patanjali, é constituído de oito partes onde são referidos os aspectos físico, mental e social.

Sem dúvida, não adianta levar a vida de qualquer maneira, sem nenhum cuidado com as atitudes, sem nenhum controle das respostas emocionais e achar que com uma série de exercícios físicos, nossa saúde estará garantida.

Por essa razão é que a ioga começa o seu sistema sugerindo normas de conduta e comprometimento ético com si próprio, chamados yamas e nyamas.

Yamas :

1. Não violência – em todos os sentidos, não violência de pensamento, palavras e ações. não fazer mal a ninguém;

2. Verdade – falar a verdade em qualquer situação, lugar, sem rodeios ou floreios;

3. Não roubar – ou melhor, não desejar o que nós não temos direito, não fizermos jus;

4. Controle – sobre os impulsos básicos de sobrevivência, sexo , apetite e etc;

5. Não acumular – não possuir com apego.

Nyamas :

6. Pureza – sentir-se limpo por dentro e por fora;

7. Contentamento – satisfação com o que se tem;

8. Perseverança – disciplina;

9. Auto-estudo – leitura e prática das escrituras essenciais;

10.Entrega – reconhecer a existência e estar em unidade com o Criador.

Esta dez normas não devem ser encaradas deforma tão resumida, é necessário um questionamento e uma análise para que se possa entender a sua amplitude. Não se deve também imaginar que todo o sistema ético esteja colocado nestas normas, mas o apresentado pela ioga sugere uma vida saudável e com objetivo, o que exige interpretação pessoal e a sincera decisão por parte do praticante para fazer o melhor possível para o seu crescimento espiritual.

Essas normas devem ser exercitadas, motivo pelo qual se diz que ioga é um sistema de filosofia prático. Sabe-se hoje em dia que grande parte dos problemas de saúde são de ordem psicossomática, e que a forma de ver as coisas e de se encarar o mundo poderia ajudar muito a manter a saúde da mente e do corpo. uma filosofia de vida mais amena com relação à competição e mais forte com relação ao porque da nossa existência, diminuiria o estresse individual.

Não devemos confundir ioga com religião ou seita, ela é um sistema de filosofia que reconhece a inter-relação: mente, corpo e alma. Mas, sem dúvida ela é compatível e pode colaborar com qualquer religião, uma vez que boa saúde e capacidade de concentração, propiciará procedimentos devocionais maiores.

Devemos entender a prática de yamas e nyamas principalmente como prevenção de problemas de saúde, através da aquisição de hábitos mais saudáveis. Mas, o que dizer das tensões que já somatizaram?

Na busca de um tônus muscular ideal, nem hipo nem hipertônico; desenvolvimento da condição de relaxamento, bom funcionamento dos órgãos internos e hábito postural correto é que a ioga propõe a prática das asanas, ou posturas que tem como princípio fundamental o alongamento passivo, sem resistência.

Asanas – parte mais conhecida da ioga, são as posturas, os exercícios que se caracterizam pela longa permanência e que para muitos parece uma espécie de autoflagelação. Na verdade estas práticas devem obedecer dois princípios: o conforto e a estabilidade. Por definição, uma asana deve ser estável e confortável, isto quer dizer que se não estiver cômodo, o praticante deverá sair da postura, ao mesmo tempo que se não estiver firme, se não houver trabalho ou controle, também não merece ser mantida.

Estes exercícios diferem dos exercícios convencionais a que estamos habituados no ocidente pela condição estática, pela atitude de não ultrapassar limites, pelo relaxamento do esforço, pelo grau de auto-observação constante e pelo baixo consumo de energia durante a prática.

Pedir para um ser humano ficar sentado por cinco minutos com a coluna ereta, sem se mexer não é para a maioria uma proposta fácil, ainda mais se a prática estiver condicionada ao prazer. O primeiro empecilho será o de nossas costas que começarem doer, seja por perda de flexibilidade ou pela existência de algum problema de coluna; o segundo é que logo vem à mente o fato de ‘com tanta coisa para fazer não posso ficar assim parado’. É fácil entender que, se o corpo não ficar quieto, também a mente não vai se aquietar. A ioga propõe um estado de controle a partir do mais fácil, ou seja através do corpo conseguir influenciar a mente.

Outro aspecto importante para compreendermos o trabalho das asanas, é a linguagem do corpo, é a expressão física dos nossos estados emocionais. É fácil percebermos se uma pessoa está feliz, triste ou tensa, de acordo com sua postura. A manifestação corpórea de nossos estados emocionais é evidente. Qual de nós já não sentiu rigidez nos músculos dos ombros e pescoço quando está muito preocupado. O que as posturas de ioga procuram fazer é o caminho inverso, ou seja, através do corpo chegar à mente. Porém, é sabido que a influência da mente no corpo é muito mais forte do que o contrário, a influência do corpo na mente é sutil e por isso o conceito de regularidade na ioga significa prática diária.

O objetivo destas posturas parece muito simples à primeira vista, preparar alguém para ficar sentado ereto e quieto para que possa fazer os exercícios respiratórios. Mas, sabemos que para conseguirmos isto é necessário muito treinamento.

Com o passar do tempo muitas funções básicas do ser humano sofreram um prejuízo em conseqüência do desenvolvimento da capacidade intelectual, cognitiva e social. Hoje numa aula de ginástica é preciso ensinar como caminhar corretamente; muitos têm que ir ao médico para saberem o quanto e o que comer; gestantes fazem curso de preparação para o parto e em alguns casos algumas pessoas têm até que aprender a respirar. E a postura natural não ficou fora disto, temos que restabelecer uma condição natural e as asanas fazem isto muito bem.

Pranayamas – outro importante canal de acesso ao sistema nervoso é a respiração. Como o corpo pode apresentar modificações no tônus muscular e na postura conforme o nosso estado emocional, mais evidente ainda é a sua interferência na respiração. Nosso padrão respiratório se modifica de acordo com as condições metabólicas, emocionais e voluntariamente. A imposição de um determinado ritmo respiratório com características específicas, na ioga se chama pranayamas.

Podemos dizer que a técnica da ioga para meditação é pranayama. A proposta básica destes exercícios é diminuir gradativamente o ritmo respiratório, dando ênfase à expiração, sem prejuízo do conforto, sem sentir falta de ar até chegar a momentos de pausa respiratória. São os exercícios mais importantes e que por isso mesmo exigem mais cuidado, são em geral mal compreendidos como exercícios de oxigenação ou coisa parecida, mas, seu principal efeito está na capacidade que tem de interferir no sistema nervoso.

Quando pensamos em controlar voluntariamente nossa respiração, é preciso que tanto as influências metabólicas como as emocionais estejam sob controle, por isso a prática de asanas deve preceder a prática de pranayamas, lembrando que relaxamento pertencer à prática das asanas e que sua prática diminui as duas influências acima citadas. Assim, bem sentados, com a coluna ereta e calmos é que começam as pranayamas.

Quando pensamos em interferir na respiração, podemos fazer isso através do ritmo, através dos movimentos e através das passagens do ar. Ou seja: posso respirar rápido ou devagar, com movimentos abdominais ou torácicos e deixando o ar passar pela boca, narina direita ou esquerda. Misturando tudo isto eu posso por exemplo: respirar, rápido com movimentos exclusivamente abdominais e pela narina esquerda; ou respirar lento com movimentos amplos na região torácica e abdominal deixando o ar entrar pela narina direita e sair pela esquerda. E assim existem várias pranayamas, mas sem dúvida seguem alguns princípios.

Mas se o tema é saúde, não vamos nos deter nas técnicas e sim no conceito. A idéia principal é a aquisição de um estado de controle que minimize as interferências danosas de um sistema nervoso sobrecarregado ou os problemas advindos do estresse. Este estado de controle pode ser chamado meditação.

Meditação – algumas frases podem definir, segundo a ioga, o que seja meditação: 1. Meditação é um estado hipometabólico sem sono; 2. Meditação é um silêncio momentâneo que às vezes aparece. É um relaxamento de pensamentos e sentimentos; 3. Meditação é a paralisação das modificações do pensamento. Muitas definições que sugerem um estado de controle, mas uma delas, embora não seja da ioga, torna o termo ‘meditação’ aplicável para várias situações do dia-a-dia; – Meditação é estar onde se está, é estar presente naquilo que se faz, é colocar a mente num só objetivo. Parece uma contradição: quando se está presente naquilo que se está fazendo, os nossos pensamentos estão ausentes e quando estamos ausentes daquilo que estamos fazendo, os pensamentos estão presentes. Se estamos executando um trabalho e pensando e mil outras coisas, estamos com a mente cheia de pensamento e portanto ausente do trabalho em questão. Mesmo não sendo uma abordagem da ioga, devemos reconhecer a importância deste tipo de pensamento para o controle da mente.

Meditação em ioga nada tem em comum com concentração intelectual. Não meditamos sobre um assunto. Porém, não se consegue parar de pensar e diminuir a velocidade ou quantidade dos pensamentos só porque desejamos. A mente não nos obedece nesse sentido. Diz-se na Índia que a mente é como um burrinho indomável, você quer levá-la para um lado e ela quer ir para outro. Se começarmos a dizer para nós mesmos: ‘fique quieto, fique quieto…’ Vamos acabar nos agitando, ou nos iludindo com o pensamento de que não estamos pensando. Por isso, já que a mente não pode ficar quieta por imposição, é que a ioga propõe um sistema complexo de técnicas de influência nas atitudes, no corpo, na respiração, para que possamos preparar a mente para a meditação. Exatamente como alguém que para plantar uma semente prepara a terra, depois rega a planta e espera que ela germine, não se pode arrancar a árvore de dentro da semente.

Para meditarmos é preciso adotar a atitude de um observador passivo, o que para nós não é fácil, estamos sempre ativos e interferindo ainda que só mentalmente em todas as situações. Observar, perceber e não questionar ou analisar é um treino.”

“Para um sistema como a ioga que considera que a maioria dos problemas de saúde tem origem na mente, meditação é o grande remédio. Ioga é meditação e as técnicas para atingi-la, também são meditação. Portanto ioga é o fim e são, também, os meios para se atingir este fim.

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